Delineadas as fronteiras de Angola no início do século XX, Portugal prosseguiu na árdua missão de ocupar efetivamente o território conquistado e torná-lo rentável. Sem capacidade financeira para realizar tais objetivos, o Estado salazarista cedia a empresas multinacionais o direito de explorar as riquezas de Angola. Os estudiosos desse período se referem a um “Estado colonial de desenvolvimento” responsável por acelerar a integração de Angola aos circuitos de trocas da economia mundial.
O custo desse “desenvolvimento” foi suportado pela população nativa, forçada a trabalhar para os colonizadores por leis criadas para esse fim, baseadas na ideologia racista de superioridade do homem branco. Mas a integração na sociedade colonial trouxe uma nova perspectiva de arranjo social e político para os povos de Angola apregoada pelos países colonizadores: o direito à autodeterminação dos povos. Definido como um direito humano pela Declaração Universal de 1948, a autodeterminação alimentou os movimentos nacionalistas pela descolonização da África e da Ásia nos anos seguintes. E, assim como Portugal havia resistido ao fim da escravidão no século XIX, no século XX foi o último Estado a admitir a perda de suas colônias de além-mar.
O Estado português se tornou uma república em 1910. No ano seguinte foi instituído o Ministério das Colônias, sinalizando a passagem da administração feita por militares, na qual prevalecia a ideia de conquista territorial, para a administração civil, que iria priorizar a integração regional e a exploração econômica.
Na década de 1920, o fascismo despontou na Europa e Portugal foi o segundo país a experimentar esse tipo de regime. O chamado Estado Novo começou a ser instituído a partir de 1926 e o professor António de Oliveira Salazar foi o seu principal líder até 1968; o regime salazarista sobreviveria até 1974. O salazarismo se agarraria com unhas e dentes aos seus domínios coloniais, de onde Portugal extraía a pouca relevância internacional que possuía.
Nesse período houve uma reorganização administrativa destinada a aumentar o controle sobre as colônias, sobretudo Angola, com o envio de funcionários fiéis ao regime, reduzindo os espaços de poder ocupados pela elite luso-angolana. Cumprindo a “missão civilizadora do homem branco”, os colonizadores justificavam a exploração do trabalho e a aculturação dos povos dominados como meios para a “evolução” dos “povos primitivos”. Para os angolanos, isso significou deixarem de cultivar suas terras, transformadas em monoculturas de algodão, café ou cana, para serem submetidos ao trabalho compulsório.
A aliança estratégica entre Lisboa e a Igreja Católica permanecia e, portanto, o argumento de conversão ao catolicismo (contra o paganismo “primitivo” e “demoníaco”) era um objetivo primordial. Juntos, nas missões religiosas e paróquias, eles impunham a nova ordem. Desde 1921 tornou-se obrigatório o uso da língua portuguesa em todas as escolas coloniais.
Produzido pelo regime salazarista, esse mapa pretendia demonstrar a “grandeza” de Portugal em razão de seu império colonial
E a discussão sobre a presença de missões protestantes em Angola, uma fonte de temores sobre a presença estrangeira desde o século XIX, tornou-se ainda mais acirrada. De fato, a ampla disseminação do protestantismo entre os ovimbundos ajudou a formar uma elite escolarizada representante do maior grupo étnico do país, além de ter criado uma vocal rede de apoio internacional ao lutar pela independência. Eles serão a força da UNITA.
Já o salazarismo adotou, como justificativa para a existência e defesa de seu império colonial, a teoria do luso-tropicalismo, criado pelo sociólogo brasileiro Gilberto Freyre. O luso-tropicalismo falava num domínio benéfico, baseado na mestiçagem das raças e na assimilação pacífica de etnias e culturas. Já a realidade era de privilégios para os portugueses e expropriação da população negra nativa, sujeita a todas as violências.
O “Estatuto Político, Cível e Criminal dos Indígenas de Angola e Moçambique” (1926) distinguia três categorias de pessoas em termos de direitos e obrigações. Os “indígenas” eram os negros, que seriam “civilizados” trabalhando para os portugueses; os “assimilados”, negros e mestiços escolarizados e cristianizados; e os “colonos”, brancos de origem portuguesa, com direitos plenos. Os “indígenas” eram tutelados pelo Estado e não possuíam nenhum direito.
O sistema educacional deixava claro seu papel de auxiliar as necessidades econômicas da metrópole, com opções distintas para os três grupos. O ensino para colonos e assimilados era oferecido em escolas públicas, embora separado. O ensino para indígenas era ministrado por irmandades católicas e protestantes, sem nenhum apoio do governo, dependendo totalmente de caridade.
O “Regulamento Geral do Trabalho dos Indígenas nas Colônias Portuguesas” declarava ser o trabalho uma “obrigação moral e legal” do indígena, permitindo a prisão por vadiagem. Em 1928, o trabalho forçado foi substituído pelo sistema de “contrato”. As autoridades podiam convocar homens para trabalhar até nove meses por ano em assentamentos de colonos e os desempregados eram obrigados a trabalhar para o Estado.
A partir de 1930 o “Ato Colonial” organizou as bases jurídicas da administração colonial, limitando as autonomias locais. Ao mesmo tempo, as autoridades locais tradicionais eram preservadas como intermediárias na relação com os “indígenas”, cobrando os impostos e recrutando a mão de obra em troca de isenções de tributos.
Angola e suas riquezas, num mapa de divulgação da ditadura salazarista
“Neste processo, a Angola colonial tardia deslocou-se do “velho” pacto colonial – em que a colônia servia como fornecedora de commodities numa economia protecionista – ao “novo” pacto colonial: uma colônia industrializada, com uma considerável população de 350.000 colonos, a segunda maior na África Subsaariana depois da África do Sul, e uma próspera economia de mercado de sisal, milho, café, algodão, minério de ferro e, claro, diamantes.” (Mathias Alencastro, p.7)
Pela primeira vez houve um deslocamento significativo de colonos portugueses para Angola. O número de imigrantes voluntários saltou de 44 mil, em 1940, para 173 mil em 1960. Até 1975 estima-se uma população de quase meio milhão de portugueses. Sua presença cercada de privilégios evidenciava a distância entre o discurso da “união das raças” e a realidade. Em sentido oposto, quase meio milhão de angolanos viviam em países vizinhos até o final da década de 1960, fugindo do domínio português.
Beneficiado pelo Plano Marshall, o salazarismo investiu no desenvolvimento das infraestruturas para aumentar a ocupação e rentabilidade do território. Mais ferrovias, rede elétrica e de comunicação, drenagem e irrigação. Contudo, Portugal não escapava à sua própria condição de país rural e atrasado, e cedia a capitais estrangeiros (belgas, americanos, franceses, canadenses) o direito de exploração dos recursos mais lucrativos. Cedia porque precisava de dinheiro e não tinha o capital necessário para investir. Os maiores beneficiários foram companhias mineradoras, que exploravam os trabalhadores angolanos em um regime de confinamento e controle absoluto.
O caso da Diamang, instalada na distante província de Lunda, foi exemplar. O tamanho do território que havia sido concedido à empresa, o controle total de todos os serviços, a criação de uma cidade (Dundo) para os brancos que foram para lá trabalhar como engenheiros e administradores, o uso das mulheres para a produção de alimentos para os mineiros sob a aparência de agricultura familiar; a capacidade de se manterem alheios durante toda a guerra de independência sem serem incomodados dão a medida do que foi esse poder.
Gráfico da produção de diamantes. Na coluna em preto, diamantes em quilates, na coluna cinza, cascalho tratado
Assim como em Portugal, o regime salazarista deveu muito de sua duração nas colônias à atuação da PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado). A polícia política ganhou poderes sobre os territórios coloniais, como o controle de emigração e imigração, e principalmente, para a prevenção de atos contra a segurança do Estado. A PIDE se instalou em Angola em 1954, quando souberam do surgimento de um movimento nacionalista apoiado pela União Soviética. Sua base era Luanda, mas havia delegações espalhadas em cidades e vilas estratégicas. Durante a guerra de independência, espionou, prendeu, torturou e assassinou em nome do Estado português.
A opção pela neutralidade na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e o domínio sobre as estratégicas ilhas de Açores, Madeira e Cabo Verde garantiram a sobrevivência do salazarismo em Portugal, após a derrota dos países fascistas. Na nova ordem bipolar da Guerra Fria, o regime ditatorial luso foi convidado a ingressar, em 1949, na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) como um dos Estados fundadores.
Em paralelo à disputa entre as duas superpotências, novos atores políticos surgiam demandando igualdade entre todas as nações e povos. A Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) se tornou seu palco principal para clamar pelo respeito ao direito de autodeterminação dos povos e denunciar a hipocrisia das velhas potências que relutavam em abdicar de seus impérios coloniais. Novamente na contramão da história, resistindo a toda pressão e isolamento internacional, Portugal só admitiu a independência de suas colônias em 1975.
Com a já conhecido tática de fazer pequenas concessões pontuais enquanto mantinha o status quo, o regime salazarista recorreu à linguagem para, aparentemente, resolver a relação de domínio exercida sobre os povos no ultramar. Assim, em 1951 o “Ato Colonial” substituiu os termos “colônia” e “colonial” por “província ultramarina” e “ultramarino”, enquanto a “Lei Orgânica do Ultramar Português”, de 1953, transformou “colônias” em “províncias”, e o salazarismo passou a falar em império “multicontinental e multiétnico”: luso-tropical. E com esse truque ilusionista, Portugal foi admitido na ONU em 1955.
A Assembleia Geral das Nações Unidas tornou-se muito importante porque ajudou a criar um movimento internacional de apoio aos movimentos de libertação nacional.
As pressões, no entanto, não deixaram de aumentar, sobretudo após a aprovação, em 1960, da “Declaração sobre a Concessão da Independência aos Países e Povos Coloniais”, incorporada em seguida como o primeiro fundamento do Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e do Pacto sobre os Direitos Civis e Políticos, de 1966, um conjunto de decisões que atualizava o sentido e os objetivos da Declaração Universal de Direitos Humanos, de 1948.
Enquanto Reino Unido, Bélgica e França se retiravam do continente africano, Estados Unidos e União Soviética disputavam aquelas áreas de influência. A aliança com movimentos nacionalistas por meio de financiamento de partidos políticos, fornecimento de armas, envio de conselheiros militares, interferiu de modo decisivo no destino das jovens nações, sobretudo pelas prolongadas guerras civis que alimentaram.
Abraçar o conceito ocidental de Estado nacional, com suas fronteiras e interesses particulares aconteceu aos jovens africanos que tiveram acesso à educação e conseguiram chegar às universidades na Europa e Estados Unidos. Olhando de fora e em conjunto, compreenderam o mundo em que viviam e descobriram que partilhavam com outros estudantes africanos as mesmas realidades de profunda violência e desigualdade organizadas a partir das relações raciais: domínio branco, opressão negra.
Dessa consciência nasceram os movimentos nacionalistas e o panafricanismo e que dominaram a África na segunda metade do século XX. Essa jovem elite educada, especialmente após a fundação da ONU (1945) e a realização da Conferência de Bandung (1955), pediu abertamente pelo fim do colonialismo, usou a ONU e outras instituições multilaterais para denunciar a hipocrisia das metrópoles recalcitrantes.
Em 1963, essa primeira geração de líderes pan-africanistas, agora na condição de chefes de países independentes, se reuniu em Adis-Abeba, capital da Etiópia, para fundar a Organização da Unidade Africana (OUA), instituição que atuaria nos espaços internacionais para apoiar os movimentos nacionalistas no continente.
Recepção de autoridades portuguesas em Luanda, 1963
Em Angola, os primeiros grupos políticos surgiram nos anos 1920, eram minúsculos, basicamente restritos à Luanda, propunham reformas, mas não falavam ainda em ruptura. Até que, em 1948, Viriato da Cruz, Antonio Jacinto e outros fundaram o Movimento dos Novos Intelectuais de Angola, claramente contestador. O MNIA publicava uma revista literária que servia de veículo para as denúncias sociais, começando pela busca de uma linguagem mais próxima do falar “angolano”. Na sua pegada, outros grupos anticoloniais e pela valorização da cultura africana foram criados.
O aumento da imigração portuguesa a partir dos anos 1950 significou, para a burguesia angolana, majoritariamente formada por mestiços e negros, perda de espaço na condução política e econômica que antes lhe pertencia. Além dos cargos públicos, a política salazarista de entregar as melhores terras para as grandes companhias exportadoras atingiu não só “indígenas” como também fazendeiros brancos, que começaram a se unir aos “assimilados” nas críticas à Portugal, invocando uma nação angolana.
O primeiro partido político abertamente separatista foi fundado em 1953, o Partido da Luta Unida dos Africanos de Angola (PLUAA). No ano seguinte, surgiu a União do Povo de Angola (UPA), baseada no etno-nacionalismo bacongo, que incluía partes dos Congos Belga e Francês.
Holden Roberto (1923-2007)
Com a independência desses últimos em 1960, os novos Estados do Congo/Zaire e da República do Congo deram abrigo a grupos separatistas bacongos e ambundos que combatiam Portugal, para organizarem seus acampamentos e redes de apoio, inclusive a entrada de armamentos.
Na década de 1950 surgiu a União dos Povos de Angola (UPA), também junto aos bacongos. Muitos de seus membros eram agricultores proletarizados, cujas terras foram tomadas por colonos plantadores de café. No início dos anos sessenta a UPA ressurge como Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), com um discurso focado no anticomunismo e menos na etnia (embora na prática não fosse assim). Seu principal líder foi Holden Roberto, amigo e cunhado de Mobutu Sese Seko, o poderoso presidente do Congo/Zaire que facilitou o trânsito pelas fronteiras e a instalação de bases de apoio para seus guerrilheiros.
Agostinho Neto (1922-1979)
O Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) surgiu em 1956 a partir da fusão do PLUA e com o Partido Comunista de Angola, fundado um ano antes com ajuda do Partido Comunista Português. Luanda foi seu berço e a elite urbana instruída era a sua base. Marxista, defendia a instalação de um regime popular baseado na aliança entre trabalhadores urbanos e campesinato, sem depender da etnia. A liderança que personificou a luta pela independência e depois primeiro presidente foi Agostinho Neto.
Os líderes do MPLA como Viriato da Cruz, Mário Pinto de Andrade, Elídio Machado, Aníbal de Melo, Lúcio Lara ou o próprio Agostinho Neto eram essencialmente membros da pequena burguesia mestiça. No início dos anos 1960, a questão racial finalmente aflorou nas discussões do partido, quando alguns membros apontaram a contradição do movimento de libertação ser encabeçado pelos descendentes dos opressores. Esse debate paralisou o MPLA por um tempo, dividindo suas forças.
Quando a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) surgiu, em 1966, a guerra de independência já estava em curso. Seu fundador foi Jonas Savimbi, uma figura polêmica. Ele foi membro do FNLA e chegou a participar do GRAE, mas rompeu com Holden Roberto acusando-o de se deixar levar pela influência dos EUA. Savimbi defendia a aproximação com a China maoísta, mas alternou alianças contraditórias durante a guerra de independência. O MPLA acusava-o de semear divisões étnicas e de regionalismo, por seu apego à base ovimbundo.
Jonas Savimbi (1934-2002)
“Resumindo, podemos dizer que o MPLA se constituiu com base na burguesia crioula, a FNLA como representante da aristocracia rural do Congo e a UNITA a partir de jovens negros do interior de Angola com formação calvinista. Assim, na origem do moderno movimento nacionalista angolano não estão tanto as divergências ideológicas, mas sobretudo factores etno-culturais.” Sintetiza o escritor angolano José Eduardo Agualusa no artigo Tentativa de explicação de Angola.
Delineava-se o que seria o dilema de quase todos os movimentos nacionalistas africanos: lutar por uma entidade política criada pelos colonizadores europeus ou reafirmar identidades étnicas e territoriais anteriores, muito mais compreensíveis à maioria das pessoas? E havia o agravante dos interesses externos explorando essas divisões e rivalidades locais, prolongando disputas políticas e fornecendo armamento capaz de produzir imensos danos junto às populações civis.
Na região da Baixa de Cassanje, ao norte de Angola, a cultura do algodão foi imposta aos camponeses em benefício da Companhia Cotonang, que possuía direito exclusivo de compra, pagando muito menos que o mercado mundial. No início de janeiro de 1961, aparentemente ligado a um movimento messiânico que se espalhava pela região e também à independência do Congo Belga, um grupo de pequenos agricultores se recusou a vender seu algodão para a empresa monopolista. Esse episódio, conhecido como “guerra de Maria”, desencadeou em algumas localidades sangrentos massacres contra os portugueses e seus empregados, provocando a fuga desesperada dos colonos. A UPA reivindica o comando dos ataques, com ações de grande repercussão em março.
Em 4 de fevereiro, a direção do MPLA decidiu tomar de assalto alguns presídios para libertar companheiros presos, num ataque direto ao Estado colonial. Como havia grande presença de jornalistas estrangeiros em Luanda, levados por outro motivo, começaram a aparecer notícias na imprensa internacional, colocando Portugal no centro de atenções indesejadas, fazendo aumentar as pressões na ONU.
Entre 7 e 10 de fevereiro, os militares bombardearam as vilas rebeladas na Baixa do Cassanje. Pelo menos 10 mil pessoas foram mortas, suas casas e plantações foram consumidas pelo fogo. Esse crime contra a humanidade foi denunciado pelo capitão português José Borges Ervedosa que fugiu para Argel, onde se tornou ativista pela descolonização. Ervedosa acusou o uso de bombas de napalm. O uso dessa substância e de bombas incendiárias nas guerras em África aparentemente foi pouco esclarecido.
O governo português foi obrigado a realizar algumas reformas para conter os ânimos, sobretudo externos. Em abril o alto comando militar foi substituído e Salazar assumiu o cargo de ministro da Defesa com o lema «Para Angola, rapidamente e em força». Mais uma vez, a troca de palavras foi a solução para negar a realidade e, em agosto de 1961, o “Estatuto do Indígena” foi abolido. O governo ofereceu incentivos para o retorno dos colonos e aparentemente retomou o controle na Baixa do Cassange.
Como símbolo político da não aceitação do domínio português, em 1961 a FNLA encabeçou a formação do Governo Revolucionário de Angola no Exílio (GRAE), que chegou a ser reconhecido por alguns Estados africanos.
Foram quase 15 anos de guerra travada em solo angolano antes que a independência fosse alcançada. O regime salazarista apostava que sua superioridade militar empurraria os movimentos nacionalistas para negociações em condições desfavoráveis, nas quais seriam obrigados a aceitar os termos da metrópole. Mas a resistência dos grupos armados e sua dispersão pelo território, especialmente quando concentrados a leste, obrigava o já endividado Estado português a gastar mais da metade do orçamento nacional nas operações militares.
Além das forças regulares, militares e colonos organizaram milícias locais, em geral tropas constituídas por homens negros, chamados “flechas”, estimados em quase 60 mil indivíduos. Já o número estimado dos que aderiram à luta anticolonial e partiram para a guerrilha gira em torno de 10 mil.
Houve um processo de militarização administrativa, enquanto a PIDE expandiu suas ações de controle, ampliando-se a violência e o autoritarismo. A continuidade da guerra resultou em prisão e tortura em massa. Em 1974 havia cerca de 12 mil prisioneiros em Angola, a maioria no campo de São Nicolau, perto de Moçâmedes. Nesse período milhares de angolanos fugiram para os vizinhos Congo/Zaire, Zâmbia e África do Sul.
Sob o argumento de proteger os angolanos das intenções maléficas dos movimentos rebeldes que eclodiam, mas efetivamente preocupados em garantir a continuidade do trabalho e da produção, o governo começou a transferir vilas inteiras para áreas controladas pelo exército, o que só fez aumentar a oposição à Portugal.
Já a guerra travada pelas três forças principais MPLA, FNLA e UNITA não foi unificada, pelo contrário, sujeitas aos interesses da Guerra Fria, não raro combateram-se mutuamente ao invés de unir forças contra o inimigo português.
Até o início dos anos 1970 as forças do MPLA dominaram o conflito e conseguiram se tornar influentes em grande parte do território angolano. Sua força vinha do apoio diplomático e militar enviados pelos soviéticos. Em 1973, o MPLA decidiu abandonar a frente leste, onde havia permanecido vários anos, para se concentrar em sua base tradicional, urbana e costeira. Sobretudo, a direção do MPLA decidiu garantir o controle sobre a região de Cabinda, onde a exploração de petróleo se tornava a principal fonte de financiamento do partido. Já a UNITA se fixou nas províncias do leste, onde a extração e o contrabando de diamantes ajudavam a custear a luta armada e o partido.
O fim do império português
Em Portugal, a interminável e dispendiosa guerra colonial disseminou descontentamento e provocou a politização das Forças Armadas. Em 25 abril de 1974, os africanos acordaram com a notícia da queda do regime salazarista em Portugal, provocada por um levante de capitães do exército, com apoio da população, a Revolução dos Cravos.
Em semanas o novo governo português começou a buscar uma solução negociada para o fim das guerras coloniais. A dificuldade estava na falta de unidade dos três movimentos de libertação nacional. Os acordos de cessar-fogo acabaram assinados em separado até outubro.
Populares saúdam as tropas do MPLA
Enquanto Luanda, a capital, era abandonada pelos portugueses, teve início uma violenta disputa entre MPLA, FNLA e UNITA pelo controle da cidade. O MPLA levou a melhor, na área que era sua própria base, enquanto as forças da UNITA se retiraram para o planalto e mantiveram sua base em Huambo. Foi preciso que a Organização da Unidade Africana (OUA, ex-OEA) pressionasse as três correntes políticas para que fosse formado um comitê único de negociação de independência.
Assim, a Junta Governativa de Angola assinou, em 15 de janeiro de 1975, o Acordo de Alvor, em Portugal. O acerto previa a formação de um governo de transição composto por representantes dos três partidos e a fusão dos grupos armados para formar um único exército nacional angolano. A transmissão formal da soberania ocorreu em 11 de novembro de 1975.
Não houve tempo para os festejos pela independência. Angola mergulhou na guerra civil.
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