A crise dos refugiados na Europa está chegando ao fim. Entretanto, o nativismo e a xenofobia são as armas dos partidos da direita nacionalista para as eleições do Parlamento Europeu, em maio. Steve Bannon, ideológo da alt-right americana e ex-assessor de Trump, procura articular as campanhas de alguns desses partidos no seu The Movement. O Brasil, por sinal, não está alheio às movimentações internacionais de Bannon: o deputado Eduardo Bolsonaro, um dos filhos do presidente, foi indicado representante do The Movement na América Latina.
As eleições ao Parlamento Europeu servirão como indicador do sismo político em curso na Alemanha, maior motor econômico da União Europeia. Três estados do leste alemão (Brandenburgo, Saxônia e Turíngia) fazem eleições entre setembro e outubro. Se o CDU (democracia-cristã, de Angela Merkel) e o SPD (social-democratas), os dois grandes partidos tradicionais, voltarem a perder votos, estará confirmado o deslocamento sísmico do sistema político alemão.
O declínio dos dois grandes partidos acentuou-se a partir da crise dos refugiados de 2015, quando Merkel, num gesto ousado, abriu as portas da Alemanha à onda de refugiados da guerra civil síria. Dali em diante, a sombra da Alternativa para a Alemanha (AfD), partido da direita xenófoba, estendeu-se sobre o país. O crescimento eleitoral da AfD deu-se, principalmente, na antiga Alemanha Oriental. Na base desse processo encontra-se o ressentimento de parcela da população do leste com as disparidades de nível de vida que ainda persistem entre o oeste e o leste alemães, tanto tempo depois da reunificação (1991).
A Alemanha foi o último dos grandes países europeus a se tornar um relevante destino de imigração. Até o início da década de 1980, o ingresso de migrantes na Alemanha era insignificante. Na época, a França era o principal destino europeu de migrantes, seguida de longe pelo Reino Unido, e mesmo Itália, Turquia e Espanha recebiam mais imigrantes que a Alemanha.
Fonte: Migration Policy Institute
O cenário mudou radicalmente em quatro décadas. A Alemanha passou a receber expressivos contingentes de turcos e, após a queda do Muro de Berlim, de migrantes da Rússia e do leste europeu. Nos últimos anos, juntaram-se a eles os imigrantes e refugiados do Oriente Médio (especialmente da Síria) e do Afeganistão.
Antes da virada do século, a Alemanha converteu-se no principal receptor europeu de migrantes, seguida de longe por Reino Unido, França, Espanha, Itália e Turquia. Hoje, o total de imigrantes na principal potência econômica europeia supera o total combinado de Espanha e Itália.
Isso não significa uma “inundação de imigrantes”, como faz parecer o discurso político da AfD. Os imigrantes representam pouco menos de 15% da população alemã. No Reino Unido, eles representam perto de 13% do total; na França, quase 12% e na Suécia, mais de 17%. As taxas de desemprego nos diversos países europeus não guardam relação com as taxas de imigração, mas com as estruturas e políticas econômicas de cada país. A onda de xenofobia alemã não se nutre de realidades estatísticas ou econômicas, mas de temores e incertezas populares explorados habilmente pela direita nacionalista.
A origem dos imigrantes é um elemento crucial no discurso nativista. O ciclo mais recente de imigração na Alemanha foi marcado pela crise dos refugiados de 2015. Sírios, iraquianos e afegãos, quase sempre muçulmanos, constituíram parcela expressiva dos demandantes de asilo. A AfD organizou seu discurso a partir da noção de um entrechoque cultural, alegando que a “cultura cristã europeia” encontra-se sob risco de dissolução. A invocação da cultura e de religião faz parte da narrativa ritual dos partidos nacionalistas europeus e, inclusive, de governantes como o italiano Matteo Salvini, o húngaro Viktor Orban e o tcheco Milos Zerman.
A crise dos refugiados alcançou seu ápice em 2016, mas vai ficando no passado. Na Alemanha, as solicitações de asilo saltaram de menos de 50 mil em 2012 para mais de 250 mil em 2015 e quase 350 mil em 2016. Contudo, em 2017 caíram para pouco mais de 150 mil e continuaram a se reduzir em 2018, ano para o qual ainda não existem estatísticas consolidadas.
A relativa estabilização geopolítica na Síria e no Iraque explica a brusca redução da onda de refugiados. Contudo, paradoxalmente, a onda da xenofobia não retrocedeu – e, ao contrário, parece continuar a crescer.
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